Como se deu a sua inserção no campo da ética empresarial?
Cecilia Arruda – Deu-se da forma mais humana e racional possível: durante meu Doutorado em Administração, na FEA-USP, fui vendo abusos que se cometiam, tanto na Academia como no mundo dos negócios, e achei que não cabia uma postura passiva. Escrevi minha tese de doutorado sobre Ética em Marketing, e a partir daí fui me envolvendo com o tema, para mim cada vez mais abrangente. A vida empresarial parece-me uma fonte excepcional de virtudes, pois sem competência não há atividade lucrativa, e, para adquirir competência, as pessoas têm que exercitar muitas virtudes com seriedade. Comecei a notar que grandes empresários eram ao mesmo tempo grandes pessoas, que contribuíam muito para a sociedade. Hoje acredito que a grande mudança necessária ao Brasil se fará a partir das empresas, e não a partir do governo ou das instituições de ensino, como seria de se esperar.
A ética vem do berço?
Cecilia Arruda – Quando a ética vem do berço, ajuda bastante. Tenho visto, no entanto, que o exemplo arrasta muito as pessoas, e por isso gosto tanto da Ética das Virtudes, da maneira como expõe o Prof. Robert Solomon, da Universidade do Texas em Austin, no seu livro traduzido e editado pela Negócio Editora: A melhor maneira de fazer negócios. A conduta ética não é estática, mas se constrói a cada ação boa. Assim, tanto uma pessoa que tenha nascido em um ambiente ético pode se transformar em um mau caráter, como alguém sem uma formação aprimorada pode se tornar um exemplo de integridade. Acredito muito na personalidade reta e no esforço sincero por fazer o bem sempre.
Thomas Donaldson, Professor da Wharton School – Universidade da Pensilvânia, referiu-se a você como “uma das mais prestigiosas e influentes personalidades do mundo acadêmico especializado em Ética na América Latina” (contra-capa do livro de sua autoria: Código de ética: um instrumento que adiciona valor). Como foi possível conquistar esse reconhecimento de um dos grandes expoentes da ética nos negócios?
Cecilia Arruda – O Prof. Donaldson tem sido um grande exemplo para mim. É um homem que batalhou sempre, desde muito jovem, e que não teve medo de ser ético num ambiente adverso. Um executivo de empresa e filósofo ao mesmo tempo, nos dias de hoje, não é fácil encontrar. Mesmo sendo um expoente, é um acadêmico que não dorme nos louros. Soube investir seu tempo para ajudar a fortalecer a ética empresarial no Brasil e na América Latina, na Rússia e em muitas regiões do mundo onde há grande dificuldade e resistência ao comportamento ético. Percebeu que houve uma resposta positiva de muitos acadêmicos na América Latina, e não quer admitir que grande parte desse resultado se deve a ele mesmo!
Qual a ferramenta alquimista (expressão empregada por Ronald Berenbeim, no I Fórum Federasul de Ética, 1999) que você usa para trazer ao Brasil as maiores sumidades em ética nos negócios?
Cecilia Arruda – Creio que a verdadeira ferramenta alquimista a que se refere o Prof. Ronald Berenbeim, executivo de ética nos negócios no The Conference Board, em New York, é a real unidade que existe entre os acadêmicos e executivos que pesquisam e trabalham com a ética empresarial. É preciso muita garra para levar adiante um projeto neste campo, pois a resistência é enorme. Assim, nós que nos dedicamos a esta área – e não somos tão numerosos assim –, tão logo nos conhecemos, em todo o mundo, nos tornamos rapidamente muito solidários. É incrível como se assemelha a pré-história das iniciativas de ética empresarial em todos os continentes. Eu arriscaria a dizer que as dificuldades por que cada um de nós passa é motivo de maior amizade e interesse por parte dos demais, que sempre se excedem no empenho de ajudar, de dar idéias, de trocar experiências. Isso é muito bonito, porque vemos que as pessoas não apenas falam em Ética, mas a vivem com profundidade. É essa coerência que arrasta e convence as pessoas de boa vontade. Portanto, quando as maiores sumidades percebem resultados positivos em regiões em que seus colegas estão trabalhando, ficam muito satisfeitas e assumem como própria parte desse sucesso, pois houve também seu esforço, lá atrás. Foi isso que ocorreu no Brasil, da mesma forma que acontece em vários outros países.
De todos os congressos e eventos sobre ética empresarial organizados por você, qual foi o mais desafiante?
Cecilia Arruda – Todos. Cada um tem sua característica de desafio. O I Congresso Latino-americano, pelo fato de não existir tradição no tema, parecia um tiro no escuro. Esperávamos 40 pessoas e apareceram 600! Foi até divertido, pensando depois. O II Congresso Mundial da ISBEE foi emocionante. O primeiro foi no Japão, e era preciso manter o alto nível de organização, dobrando o número de participantes, com metade do orçamento e o triplo de preocupação com segurança. Foi incrível ver aqui na FGV-EAESP, São Paulo, 400 pessoas oriundas de 41 países, e nenhum contratempo. Todos se foram felicíssimos, encantados com o Brasil.
Quais os seus prognósticos para o desenvolvimento da ética empresarial na América Latina?
Cecilia Arruda – Eu diria que o futuro econômico da América Latina está na ética empresarial. Os modelos de capitalismo selvagem e do socialismo extremo não apresentaram resultado na América Latina. A ética empresarial é exatamente o que está no meio dos dois. A empresa ética tende à sobrevivência com sucesso, pois garante a satisfação de todos os stakeholders, isto é, de todos os públicos que, de alguma forma, se relacionam com a organização: desde os acionistas e empregados, até os clientes, fornecedores, concorrentes, agentes do governo, cidadãos em geral. É preciso muita competência, e também muita virtude. A competência vai sendo adquirida aos poucos, com o desenvolvimento da tecnologia e das comunicações on-line, que encurtam distâncias e possibilitam acesso à informação a grande parte da população. Viver as virtudes, no entanto, não é algo que se possa improvisar. Os latino-americanos parecem mais treinados nisso que outros povos. Acredito, sinceramente, que há muita gente preparada para levar adiante o desenvolvimento sócio-econômico-cultural dessa Região, se lhe for assegurada a possibilidade de agir eticamente nos negócios e ao mesmo tempo competir.
Sobre a obra
Em Ética na Vida das Empresas. Depoimentos e Experiências, a professora e advogada Maria do Carmo Whitaker apresenta-nos entrevistas e ensaios de empresários, dirigentes e professores de administração, economia e jornalismo, para ressaltar o impacto da Ética no mundo dos negócios e analisar a gestão da ética, a responsabilidade social, a sustentabilidade das instituições e relevantes temas sobre a vida empresarial.
Como profissional, desenvolve treinamento para incentivo à cultura ética nas organizações, implantação de códigos de ética, análise de conflitos e desvios de conduta, discussão e reflexão sobre Ética etc., além de ampla divulgação de obras e textos específicos em seu portal sobre Ética Empresarial.
Relação dos entrevistados
1. Adriane Imbroisi
2. Anísia Sukadolink
3. Antonio Ermírio
4. Antonio J. Matias
5. Antonio Rodríguez
6. Carlos Alberto Di Franco
7. Carlos Alberto Júlio
8. Christin Hokenstad
9. Donizete Santos
10. Elias Camargo
11. Gabriel Chalita
12. Geraldo Barbosa
13. Héctor Jasminoy
14. Helder Haddad
15. Heródoto Barbeiro
16. José Guimarães Monforte
17. José Maria Ramos
18. Julio Lobos
19. Lélio Lauretti
20. Marcos Cintra
21. Marcos Kisil
22. Marcos Levy
23. Cecilia Arruda
24. Maria do Carmo Whitaker
25. Maria Solange Senese
26. Mario Ernesto Humberg
27. Mauricio Bellodi
28. Nuria Chinchilla
29. Peter Nadas
30. Renato Opice Blum
31. Ricardo Chuahy
32. Rodolfo Leibholz
33. Sérgio de Oliveira
34. Wilberto Lima