Depois de 20 anos de experiência, pesquisa e reflexão, estou piamente convencido de que a capacidade de tomar grandes decisões sobre pessoas é o fator mais preponderante para o nosso sucesso profissional. Observe ainda que, quanto mais caminhamos na carreira e quanto mais escalamos a hierarquia organizacional, mais importante esse tipo de decisão tende a se tornar —, tanto em termos absolutos, quanto em relação a todos os outros fatores.
Por Cláudio Fernández-Aráoz.
Já estávamos em meados de 1986. Em breve participaria de uma reunião em Zurique. Nos quatro dias precedentes, passei por Londres, Paris, Copenhague e Bruxelas. Em cada uma dessas cidades, fui entrevistado por consultores da Egon Zehnder International (EZI), empresa internacional de recrutamento e seleção de executivos. Até então, já havia participado de trinta encontros, incluindo as reuniões com diversos sócios da empresa e também com todo o comitê executivo.
Em Zurique, porém, estava programado para me encontrar com o próprio Egon Zehnder — fundador da empresa e, naquela época, presidente. Eu estava, no mínimo, tenso. (Ainda hoje consigo me lembrar do nervosismo que senti naquele dia.) Estava bem ciente do prestígio e da envergadura do homem à minha frente, o qual — tendo se formado na Escola de Negócios de Harvard no ano em que nasci — criou em 1959 a profissão de recrutamento de executivos na Europa e, em 1964, fundou sua própria empresa de recrutamento, que de imediato começou a se expandir internacionalmente. Em poucas palavras, Egon Zehnder era uma lenda.
Fico constrangido em dizer que não me lembro de várias das perguntas que ele me fez naquele dia. Por algum motivo, contudo, lembro-me das perguntas que eu fiz a ele. Recordo-me, particularmente, de ter lhe perguntado algo do tipo: “Tendo por base sua experiência na atividade de recrutamento de executivos, que já passa de 25 anos, encontrando-se com clientes bem-sucedidos e candidatos a posições de alto nível, o que, em sua opinião, faz uma pessoa ser bem-sucedida?”.
Se bem me lembro, pensei que ele usaria uma elaborada teoria sobre sucesso para responder a essa pergunta. Afinal de contas, ele próprio era um homem extremamente bem-sucedido. Tão logo pude constatar que era um homem de sólidas convicções e grande integridade. Mas o que esse grande homem me respondeu? “Sorte!” Admito, mas fiquei um tanto quanto surpreso — sorte? E ele prosseguiu, nos seguintes termos:
“É claro que as pessoas promissoras que conheci são todas extremamente inteligentes. E também muito dedicadas ao trabalho. Elas acreditam na preparação. Relacionam-se muito bem com as outras pessoas. Mas se você me pede para apontar o principal motivo do sucesso dessas pessoas, digo que é a sorte. Elas tiveram a sorte de nascer em determinadas famílias e de nascer em determinados países. Tiveram a sorte de ter alguns dons exclusivos. Tiveram a sorte de poder freqüentar boas escolas e obter boa educação. Tiveram a sorte de trabalhar para boas empresas. Tiveram a sorte de permanecer saudáveis. Tiveram a sorte de ter oportunidade de promoção. Portanto, respondendo à sua pergunta, o principal motivo do sucesso individual é a sorte.”
Se eu tivesse sido um pouco mais ágil (e talvez um pouco mais intrépido), teria me recomposto e lhe perguntado qual era o segundo motivo mais importante. Mas o momento passou, e logo começamos a conversar sobre outros assuntos.
Desde esse distante encontro, tive incontáveis oportunidades de revisitar essa mesma pergunta e também a resposta de Zehnder. Muitas vezes, tive de concordar com a sabedoria de nosso fundador: a sorte sem dúvida teve parte na carreira de inúmeras pessoas, incluindo a minha. Mas tentei também encontrar algumas respostas mais sistemáticas que pudessem ajudar as pessoas a agir. (Dizer a alguém para “ter sorte” não é, obviamente, suficiente.) Por isso, quando entrevisto excelentes candidatos em ummandato de busca de executivo, me reúno com clientes extremamente importantes, converso com executivos que desejam seguir uma nova carreira, dou palestras aos alunos da Harvard Business School, contemplo meus próprios filhos, continuo a fazer essa mesma pergunta: “O que, exatamente, leva a uma convincente carreira de sucesso??”.
Hoje, já se passaram mais de vinte anos da minha primeira reunião com Egon. Ao longo dessas duas décadas, conduzi aproximadamente vinte mil entrevistas (em torno de mil ao ano ou quatro por dia útil, no decorrer de minha carreira como consultor na área de recrutamento de executivos). Viajei pelo mundo inteiro, seja para trabalhar nos mandatos de nossos clientes, treinar nossos colegas, participar de reuniões com o comitê executivo ou nossos sócios ou dar palestras. Durante essas viagens, travei milhares de conversas pessoais intensas e comoventes com diretores e executivos, discutindo suas carreiras, suas vidas, suas glórias e seus dramas.
Testemunhei grandes sucessos, mas também amargos sofrimentos. Tive oportunidade de conhecer alguns notáveis exemplos de gestão de carreira e de vida. Infelizmente, também tive oportunidade de conhecer algumas pessoas de admirável talento que se mataram — literalmente.
Reconheço que essa questão até certo ponto tem se tornado uma obsessão para mim. Por que determinadas pessoas são bem-sucedidas e outras malsucedidas? Acho que tenho a resposta.
A fórmula do sucesso
Primeiro, como observado antes, não discordo de Zehnder quanto à sorte. A sorte pode exercer influência de todas as formas por ele enumeradas e também de muitas outras. Num grau extremo, a má sorte pode acabar com uma carreira, seja provocando a morte ou outras tragédias.
Acredito, contudo, que a fórmula do sucesso profissional compreende pelo menos quatro outros fatores. São eles:
1. Genética
2. Desenvolvimento
3. Decisões de carreira
4. Decisões sobre pessoas
Estou convencido de que esses fatores se reforçam e se complementam, criando um efeito multiplicador. Acredito também que a maioria deles tem diferentes pesos em diferentes estágios de nossa vida. A exceção, obviamente, é a herança genética, que, tal como a sorte, mantém sua relevância do nascimento à morte. O desenvolvimento é de igual modo importante por toda a vida, mas é particularmente decisivo nos estágios iniciais. As decisões de carreira tornam-se essenciais quando atingimos a casa dos vinte. E por último (mas não menos importante) vem o que costumo chamar de “decisões sobre pessoas”.
Antes de prosseguir, deixe-me lhe apresentar logo de cara a moral da história: tenho absoluta certeza de que, assim que você completa sua educação formal e inicia sua carreira profissional, as decisões sobre pessoas são o único e mais importante fator a contribuir para o seu sucesso profissional.
Vejamos agora cada um dos fatores um pouco mais detalhadamente.
A genética desempenha um papel importante e contínuo. Nossa constituição genética explica (por exemplo) por que algumas coisas são fáceis de aprender, enquanto outras são extremamente difíceis. A genética estabelece limites da mesma forma que nos abre portas. Entretanto, não é totalmente estática. Embora até há pouco tempo a genética fosse considerada uma constante na fórmula do sucesso, pesquisas atuais mostram que mesmo a herança genética pode ser considerada dinâmica. Como demonstrou Matt Ridley em Nature Via Nurture, nossa experiência cotidiana determina, em parte, quais genes são ativados, o que, por sua vez, determina quais proteínas são fabricadas, o que, por sua vez, configura e reconfigura as sinapses entre nossas células cerebrais.1 No debate sobre natureza versus criação (nature versus nurture), parece que ambos os lados têm razão.
O desenvolvimento, que na verdade é uma forma abreviada que utilizo para me referir à aprendizagem formal e informal que se processa ao longo de toda a nossa vida, pode exercer grande influência em seu sucesso profissional. Sua capacidade de aprender também depende, em parte, das suas escolhas de carreira. Que oportunidades de aprendizagem são colocadas à sua frente no ambiente de trabalho? Você continua se deparando com coisas novas?
Obviamente, investir com sabedoria tempo e esforço no desenvolvimento profissional pode aprimorar de maneira significativa seu nível de competência e, portanto, aumentar suas chances de sucesso. As melhores experiências de desenvolvimento podem ter enorme impacto.
Todavia, existem limites nítidos em relação ao potencial de desenvolvimento. Como observado antes, sua capacidade de aprender depende em parte de sua genética. Além disso, embora me doa dizer isso, a capacidade de aprender diminui com a idade.2
Sim, é possível ensinar a um cão idoso novos truques; só que demora mais tempo e talvez ele não consiga retê-los totalmente. Portanto, os custos e os benefícios do treinamento mudam sutilmente ao longo dos anos.
Eu vou deixar o meu amigo Lyle Spencer sintetizar o potencial do desenvolvimento, com seu estilo expressivo (ele é uma sumidade mundial tanto em seleção quanto em desenvolvimento): “É possível ensinar um peru a escalar uma árvore”, afirma Spencer, “mas eu preferiria contratar um esquilo”.
O impacto de escolhas ou decisões de carreira nunca deveria ser subestimado. Em grande parte de minha vida profissional, sempre me impressionaram as diferenças marcantes com relação ao êxito pessoal dos indivíduos que iniciam sua carreira com talentos praticamente semelhantes, mas que escolhem ambientes de trabalho em grande medida diversos. Entre meus colegas de classe na universidade, por exemplo, vários verdadeiramente brilhantes e talentosos cometeram o erro de aceitar emprego em empresas não profissionais e extremamente burocráticas; hoje, em termos profissionais, estão a quilômetros de distância atrás de nossos colegas de classe com talentos semelhantes que seguiram planos de carreira mais promissores e por acaso encontraram empregadores mais esclarecidos e inteligentes. Em resumo, as boas escolhas em relação à carreira multiplicam os frutos dos esforços pessoais de desenvolvimento e, por isso, são um dos principais fatores para se ter um extraordinário sucesso profissional.
Em seu livro Career Imprints: Creating Leaders Across an Industry [Vestígios de uma Carreira: Criando Líderes em um Setor], a professora Monica Higgins, de Harvard, conta como os “meninos de Baxter” construíram o setor de biotecnologia nos Estados Unidos.3 Fundamentada em seu estudo sobre 300 empresas de biotecnologia e 3.200 executivos de biotecnologia, Higgins conclui que uma única empresa — a Baxter Labs — foi o celeiro de uma quantidade surpreendente de cisões (spinoffs) e empresas recém-estabelecidas (startups). Esse fenômeno — de uma empresa que gera líderes para um setor inteiro — também foi testemunhado em outros setores, como foi o caso da Hewlett-Packard e Apple, na área de hardware de alta tecnologia, e da Fairchild, na área de semicondutores. Obviamente, com relação ao sucesso profissional de longo prazo, ser colocado em um viveiro de inovações é melhor do que ser colocado em um lugar atrasado, longe de tudo e de todos.
Para a maioria de nós, as decisões sobre pessoas acabam se tornando importantes quando entramos na casa dos vinte. Na vida pessoal, cultivamos amizades que duram a vida inteira — na faculdade, na pós-graduação, na igreja e no bairro em que vivemos. Conhecemos e nos casamos com pessoas que serão nossos parceiros de vida. E, no ambiente de trabalho, começamos então a tomar decisões sobre pessoas, colegas, clientes e fornecedores.
Assim que alcançamos o posto de gestor, começamos a trabalhar por meio de outras pessoas. Daí, portanto, nossas decisões sobre essas pessoas passam a ser essenciais para o desempenho da unidade sob nossa responsabilidade. À medida que nossas responsabilidades se ampliam, os riscos se ampliam, porque a única forma que temos de exercer controle é por meio da equipe que formamos. E quando você passa de gestor a alto executivo e, eventualmente, a CEO ou presidente do conselho, as decisões sobre pessoas tornam-se ao mesmo tempo seu maior desafio e sua maior oportunidade.
Agora, vou reformular a moral da história: depois de vinte anos de experiência, pesquisa e reflexão, estou piamente convencido de que a capacidade de tomar grandes decisões sobre pessoas é o fator mais preponderante para o nosso sucesso profissional. Observe ainda que, quanto mais caminhamos na carreira e quanto mais escalamos a hierarquia organizacional, mais importante esse tipo de decisão tende a se tornar —, tanto em termos absolutos, quanto em relação a todos os outros fatores.
Grandes Decisões Sobre Pessoas
O livro é uma abrangente fonte de referência concebida para os gestores que desejam aprimorar sua competência pessoal em contratação e promoção de pessoas e a todos aqueles que tenham algum interesse por essa área.
Já com uma bagagem de duas décadas de experiência na área de contratação e desenvolvimento de pessoas competentes, Claudio Fernández-Aráoz apresenta neste livro diretrizes simples, mas iluminadas, que abrangem toda a gama de problemas inerentes à contratação, promoção e delegação de importantes responsabilidades aos grandes empreendedores.
Claudio Fernández-Aráoz é sócio e membro do comitê executivo da Egon Zehnder International, firma global líder na busca de executivos, onde atua há mais de vinte anos realizando projetos para importantes organizações do mundo inteiro. Com MBA pela Stanford e experiência prévia na McKinsey & Company, Fernández-Aráoz já publicou vários artigos de sucesso em algumas das melhores publicações de negócios, como a Harvard Business Review e MIT Sloan Management Review.