Embora a padronização normalmente seja algo bom — ela preserva a energia do pensamento, prevê o futuro, dá conta rapidamente das tarefas cotidianas, facilita a aprendizagem e nos ajuda a entender o mundo —, do ponto de vista do pensamento produtivo, ela pode ser um problema.
Por Tim Hurson.
Comumente, a padronização nos leva a presumir coisas que na verdade não existem em um dado lugar ou situação, como minha visão da cobra ou como quando imaginamos que Janie tem 10 anos de idade. Ou como nossa provável interpretação da ilusão de ótica a seguir, de Oliver Selfridge.
É praticamente impossível não enxergar isso como THE CAT (O Gato)
O caractere do meio em cada conjunto não é nem H nem A. É um híbrido de ambas as letras e é idêntico em ambos os conjuntos. No entanto, é praticamente impossível a um leitor de língua inglesa não enxergar a aglomeração de formas como THE CAT. Nenhum leitor deste livro, com certo referencial da língua inglesa, conseguirá olhar para essas formas e dizer: “Não faço a menor idéia do significado disso”. E poucas pessoas conseguirão se forçar a ver a forma de ambas as letras como uma única letra — por exemplo, THE CHT.
Observe como a padronização consegue também evitar que enxerguemos o que de fato existe em um determinado lugar/situação. Dentre as inúmeras descobertas que a NASA fez quando começou a mandar pessoas ao espaço foi que as canetas dos astronautas não funcionavam bem por causa da ausência de gravidade. A tinta não fluía apropriadamente. Você pode simular esse efeito em casa. Tente escrever com a caneta inclinada, com a ponta voltada para cima. Em pouco tempo, a tinta deixa de fluir e a caneta pára de escrever. Para solucionar esse problema, a NASA reuniu várias equipes de engenheiros mecânicos, químicos e de hidrodinâmica, permitindo que se infundissem no problema, e gastou milhões de dólares em pesquisas e protótipos para desenvolver o que passou a ser chamado de space pen ou caneta pressurizada. Essa caneta funcionou perfeitamente bem. Quando não havia gravidade, quando se escrevia de cabeça para baixo aqui na terra e até mesmo debaixo d’água — um verdadeiro milagre tecnológico.
Nossos arqui-rivais naquela época, os soviéticos, também conseguiram solucionar esse mesmo problema, mas de uma maneira bem mais barata e, há bons motivos para acreditarmos, bem mais eficaz: eles forneciam lápis aos astronautas!
Os cientistas da NASA estavam se valendo de padrões enraizados na alta tecnologia. A despeito do fato de vários dos engenheiros que estavam tentando solucionar o problema terem provavelmente usado lápis, eles não conseguiram ver que em suas mãos havia uma solução imediata, barata, atraente e confiável, que não envolvia praticamente nenhuma tecnologia. Eles enxergaram o problema perguntando-se de que maneira poderiam fazer com que uma caneta escrevesse quando não houvesse gravidade, e não simplesmente se perguntando de que modo poderiam escrever na ausência de gravidade.
No final da década de 1960, três cientistas que trabalhavam em um laboratório de pesquisas em Lausanne, Suíça, propuseram uma atraente solução para a cronometragem precisa de experimentos laboratoriais. Eles usaram pulsos eletrônicos, cristais de quartzo e tubos de Nixie (os precursores dos modernos mostradores digitais), tudo isso disposto em um compartimento do tamanho de um forno de microondas. Demonstraram então sua descoberta à diretoria, que ficou encantada com os resultados. O tal instrumento era barato, preciso e, pelo fato de não conter nenhuma peça móvel, era altamente confiável em inúmeras condições ambientais, como flutuações de temperatura e pressão, vibração, poeira e uso prolongado. Contudo, ninguém — nem os cientistas, nem os gerentes e tampouco os diretores — enxergou essa invenção iluminadamente como um possível relógio. Isso simplesmente não se encaixava no padrão de relógio desses indivíduos. Não era pequeno o suficiente para ser um relógio. Não tinha ponteiros, nenhum mostrador, nenhum botão serrilhado para ajustar a hora. Nunca lhes ocorreu que aquela peça de equipamento de laboratório poderia ser também um relógio.
Porém, duas empresas de eletrônicos, uma no Japão e outra nos EUA, não estavam obstruídos pelo conceito suíço do que deveria ser um relógio. No prazo de dez anos, a Seiko e a Texas Instruments transformaram o mercado internacional de relógios. Em meados da década de 1970, a predominância suíça no mercado de relógios de pulso implodiu. De 75%, passou a deter 25% do mercado mundial. E sua lucratividade anual em âmbito global passou de 85% para 10%. Inúmeras marcas domésticas desapareceram e milhares de artesãos de relógios suíços perderam o emprego. Tudo isso por causa do pensamento padrão dos suíços.
Will Rogers percebeu perfeitamente os perigos da padronização quando disse: “Não é o que não sabemos que nos prejudica, mas o que temos certeza de que não é verdade”. É difícil mudar padrões. Alguns anos atrás, minha mulher, Franca, julgou que havia conseguido mudar um padrão em relação ao local em que ficava nossa gaveta de talheres, na cozinha. Parecia que toda vez que um de nós queria pegar algo na gaveta, outra pessoa estava na frente.
Suportamos essa pequena inconveniência durante anos, mas um dia Franca resolveu fazer uma mudança. Sem dúvida nenhuma, a gaveta ficou bem melhor naquele novo lugar: central, fácil de alcançar e sem tanto congestionamento. Funcionou perfeitamente, exceto por um fator. Durante meses, toda vez que queríamos um talher, habitualmente abríamos a gaveta antiga. E sempre que isso ocorria, dávamos risada, e só então nos dirigíamos à nova gaveta. O padrão de abrir a gaveta antiga era tão persistente que resolvemos afixar um papel para recordar quantas vezes havíamos tentado abrir a gaveta errada. Mesmo com esse lembrete, ainda assim procurávamos a gaveta antiga na maioria das vezes. Foi necessário um ano para quebrarmos nossos velhos padrões. Porém, ainda hoje, quase dez anos depois, se eu estiver muito distraído, procuro a gaveta antiga. Você provavelmente já passou por experiências semelhantes.
Pense Melhor – Um guia pioneiro sobre o pensamento produtivo (o futuro de sua empresa depende disso… assim como o seu)
Obra escrita por Tim Hurson, sócio-criador da empresa de formação de capital intelectual thinkX (www.thinkxic.com) que oferece treinamento, assistência e consultoria a empresas internacionais sobre pensamento produtivo e inovação. O autor também é membro do corpo docente e do conselho de administração da Fundação de Educação Criativa, além de diretor-fundador da Facilitators Without Borders (FWB).